
Prof. Me. Paulo Vitor Souza da Luz
A história da CVI e a devoção a Nossa Senhora do Amparo são indissociáveis. Juntas, elas constituem aspectos fundamentais para uma compreensão mais profunda da história do povo valenciano.
Na década de 1840, ocorreu, conforme o pesquisador Waldir Freitas Oliveira, um “surto de industrialização” na Vila de Nova Valença do Santíssimo Coração de Jesus, conferindo-lhe notoriedade na Província e no Império. Esse processo foi impulsionado por um contexto sociopolítico favorável ao desenvolvimento de determinadas indústrias, influenciado pela Revolução Industrial na Inglaterra.
Em 1844, iniciou-se a construção da fábrica que veio a ser denominada Todos os Santos, entrando em funcionamento em 1º de novembro de 1847.
As atividades econômicas resultantes da recém-instalada indústria têxtil na Vila de Valença do Santíssimo Coração de Jesus foi um dos fatores decisivos para sua elevação à categoria de cidade. Dessa forma, em 10 de novembro de 1849, ocorreu a emancipação política de Valença.
Por volta de 1960, foi fundada na cidade uma segunda fábrica têxtil, a Nossa Senhora do Amparo, localizada abaixo do outeiro da igreja que lhe deu nome. Posteriormente, essa unidade passou a integrar a Companhia Valença Industrial (CVI), resultante da fusão entre a fábrica Nossa Senhora do Amparo e a Todos os Santos. Com a constituição de uma sociedade anônima, as atividades da fábrica Todos os Santos foram encerradas, e seus equipamentos foram transferidos para as instalações da Nossa Senhora do Amparo.
A CVI, atualmente rebatizada como Valença Têxtil, sempre manteve uma estreita relação com a devoção a Nossa Senhora do Amparo. Evidências indicam que a família do Comendador Bernardino de Sena Madureira, um dos primeiros proprietários das instalações da CVI, era devota da santa, o que sugere que a escolha do nome original da fábrica não se deveu apenas à proximidade com a Igreja do Amparo.
Segundo o memorialista Carlos Henrique Ferreira dos Passos, por volta de 1960, durante a inauguração da fábrica Nossa Senhora do Amparo, o Comendador Bernardino de Sena Madureira coroou a imagem da santa com uma coroa de seis hastes, encimada por uma pomba, a qual ainda hoje é utilizada durante o período festivo. Além disso, no portão principal da fábrica, foi construído um pequeno oratório contendo uma imagem de Nossa Senhora do Amparo, posicionada acima do letreiro com os dizeres “Companhia Valença Industrial Nossa Senhora do Amparo”, que permanece visível nas atuais instalações da Valença Têxtil.
Na segunda metade do século XIX, o Comendador Bernardino de Sena Madureira reformou a igrejinha de Nossa Senhora do Amparo, modificações estas, conforme a tradição oral da cidade, inspiradas na Igreja de Nosso Senhor do Bonfim, em Salvador. Após a reforma, além da nave e da capela-mor, que foram preservadas da estrutura original da capela, foram acrescentadas duas torres, duas sacristias e corredores laterais, sem a sobreposição de galerias de tribunas.
Na Igreja de Nossa Senhora do Amparo, foi colocada uma lápide e urna funerária em homenagem ao pai do Comendador Bernardino de Sena Madureira, o Capitão-Mor Bernardino de Sena Madureira, falecido em 1852, as quais permanecem no local até os dias atuais. Já o Comendador Bernardino de Sena Madureira, falecido em 1887, teve sua lápide funerária colocada no altar-mor da mesma igreja.
Com o passar dos anos, a relação entre os operários da CVI e Nossa Senhora do Amparo perdurou, uma vez que a santa, patrona da classe operária, se configurava como um "amparo" nas adversidades do trabalho fabril ao longo de diferentes épocas. O cetro, símbolo de realeza presente na iconografia de Nossa Senhora do Amparo, em sua mão direita, foi apropriado pelos operários, sendo reinterpretado como um fuso – um utensílio cilíndrico de madeira, utilizado no tear para fiação e torção de fibras.
Além disso, os operários passaram a organizar os festejos em honra a Nossa Senhora do Amparo, financiando a festa por meio de descontos em seus próprios salários, prática que perdurou até a década de 1980. Os operários também realizavam uma procissão, levando a imagem de Nossa Senhora do Amparo do oratório no portão da fábrica até a colina em uma das noites das novenas. A missa das 7 horas no dia de Nossa Senhora do Amparo, 8 de novembro, ficou conhecida como a "missa dos operários" e é celebrada até os dias atuais, mantendo a tradição de ser acompanhada pela prática de ir descalço, costume iniciado pelos próprios operários, conforme a tradição oral da cidade.
A história da CVI e a devoção a Nossa Senhora do Amparo são indissociáveis. Juntas, elas constituem aspectos fundamentais para uma compreensão mais profunda da história do povo valenciano.



